terça-feira, novembro 29, 2005

redundante

hoje quero falar do jogo
não de palavras ou intentos
falo de luzes
em festa
do arrebentar de rojões
.
nada deixado ao acaso
em nosso contentamento
pressentimento tornado foco
cálice iluminado
pelo brilho da aventura
.
alma opaca não resiste
à caminhada feita em fogo
a corações juntos no abraço
ao ardor tornado canto
.
se é persistente a paixão
renova-se certeiro o verbo
em júbilo mantém-se aceso
o entusiasmo
redundante
lume
.
(dedicado a db, o melhor abraço daquela noite)

domingo, novembro 20, 2005

RESTOS













.
.
.
o sol...
ele se vai
ou chega
pouco importa
se permanecem
escuro o norte
o horizonte em chamas
o vácuo...
lacunas dos sombrios
restos
.
(menina, mais uma vez dedico a você, agradecendo pela foto-inspiração)

sexta-feira, novembro 18, 2005

A CAVERNA

Às escuras, acorrentados, avançar através do covil.
Decifrar o que dizem as sombras em movimento.
Na névoa, tocá-las.
Na mudez, perscrutá-las.
Na cegueira, descobrir seus anseios.
.
Longe na memória ainda há lembranças
Do que nos levou tão longe, mas
Não sabemos mais o porquê da cadência repetida,
Das infinitas voltas em círculos.
.
Ouvimos rumores de que poderia ser diferente.
Rumores prontamente desmentidos!
Nem do assassinato daquele pobre lunático se fala mais.
Lembra-se dele?
Aquele que jurava ter visto algo semelhante à luz?
Estivemos por enxergar.
.
Quase chegamos a ver o sol brilhando lá fora.
E quando estávamos prestes a aprender a ter esperança,
Já não havia mais o que esperar.
O assombro nos abocanhara.
.
(um texto saído do baú - agosto de 2004)

terça-feira, novembro 15, 2005

CENA RÁPIDA - O MONÓLOGO

- um dia...
estaremos já mudos no assombro
e seremos por ele engolidos
.
enquanto espero ser digerida
tranqüilamente
consumo a revista semanal
bebo toda a caixa de uísque
e fumo um charuto...
.
- corta!
.
(em exibição no cine-teatro república)

sábado, novembro 12, 2005

FESTA PARA DOIS AMORES

minha filha,
teu olhar verde-azulado
leva-me a horizontes tantos
nem consigo definir
é carinho, é alegria
às vezes pergunta e até zanga
mas sempre luz para vida
matizando o futuro
nesse leve tom
azul-esperançado.
conserva-o...

é de Deus um dom.
é o que nos sustenta.

.
..//..
.
meu veinho,
sempre ocupado
em mil trabalhos
traquinagens de menino grande
da teoria à imagem à poesia
e eu no olhar

me inspiro
acompanho
a loucura da razão
lucidez refletida
nos sonhos produzidos:

vida
.
..//..
.
Dois aniversários e quem ganha sou eu...
meus dois presentes, meus dois amores...
agradeço a Deus pelo dom da vida com vocês.

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Novo blog no ar: http://maresrevoltos.zip.net/
À minha amiga Ádina desejo sucesso.

terça-feira, novembro 08, 2005

lágrima

teus
olhos
vermelhos
falavam: eu morro
nesta solidão tormenta
e tanta gente à nossa volta
que eu em solidão calada
nem pude ao menos
dizer-te: por uma vez tenta
pedir. sairei de mim
prometo
serei o teu
socorro
!

sexta-feira, novembro 04, 2005

DOIS PERDIDOS - O DESFECHO

Continuação do post anterior

Ele contando:
Poderia ter inventado uma desculpa, mas não, caí de novo. Nem consegui descobrir o que ela quer comigo. Mulher maluca, desorientada. Canta, dança, dirige, tudo ao mesmo tempo. Tão destrambelhada que nem percebeu a minha investida. Mulher doida, ainda se perdeu várias vezes fazendo com que eu me perdesse também. A reunião começando e eu ainda à espera do elevador. Quando a porta se abriu me vi lá no fundo. O espelho mostrava meu desalinho, imperdoável para um executivo. Passei a mão pelos cabelos desgrenhados, sem sucesso. Em São Paulo, ninguém mais anda com os vidros abertos. Só ela. Aquela avoada.
Ao entrar na sala fui fuzilado pelo presidente do conselho.
Não era a primeira vez. E sempre por causa da oferta irresistível. Resolvi naquele instante. Carona com ela, nunca mais.
Sentei-me, abri meu laptop e dirigi a atenção para o relatório que estava sendo apresentado. Aos poucos aquela lengalenga foi me entorpecendo. Parecendo estar em transe, digitei o nome dela. Que susto! DOIS PERDIDOS! Um relato do que acabáramos de viver. Como ela consegue ser tão rápida? Ao meu riso alto, um psiu generalizado na sala. Ela falando de ternura e aquele “Você é meu GPS” piscando frente aos meus olhos...
- Você está na contra-mão de nossos trabalhos, disse o presidente.
Só então me dei conta. Voltei a ler o texto atentamente. Fechei o laptop com um golpe rápido. Levantei-me e saí quase correndo sem olhar para trás. Enquanto descia já fui arrancando a gravata ao mesmo tempo em que pegava o celular.
Digitei o número.
- Atende!
Caixa postal. Tentei de novo.
- Oi, fala!
- Acabei de ler o seu blog. Volta aqui para me pegar.
- O quê?
- Abaixa o volume do rádio, disse, ou melhor, gritei.
- Pronto. Estou ouvindo. Pode falar.
- Volta para me pegar.
- Agora? Estou enroscada numa rua chamada Tito... onde é isso? Para que lado...
- Mas o que você está fazendo na Lapa? Não deveria ir para a zona leste? Essa sua mania de só pensar em escrever!
- Me ajuda... como saio dessa?
E ela ainda ri.
- Fácil, é só você... deixa pra lá... vai começar tudo de novo... não saia daí, estou pegando um... Táxi!
Assim que embarquei... começaria tudo outra vez...
Só tive o trabalho de mudar o tempo do verbo.
A gravata? Joguei-a pela janela.

Eu assistindo:
Nunca mais cruzei com eles até que segunda-feira, passando pela Vila Madalena, encontrei-os. Estão casados, têm dois filhos - Eduardo & Mônica.
Abriram juntos uma editora especializada em poesia. Ele, com toda experiência em finanças, administração, marketing e ela, com a sensibilidade para revelar poetas, fizeram da empresa um sucesso. Todos os dias enchem a mala do carro com livros e saem vendendo de porta em porta.
Ela instalou um GPS no carro. E ele, sempre que se senta no banco do carona, apressa-se em desligar o aparelho e, claro, em sintonizar o rádio. Nesse dia não foi diferente. Logo que nos despedimos... amor meu grande amor, não chegue na hora marcada...
E lá se foram cantando... os pneus.
De longe ainda pude vê-lo gesticulando, braço para fora da janela, apontando para a direita, enquanto o carro virava à esquerda.
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(Dedicado a Gonzaguinha, Legião Urbana e Ângela Ro Ro, a quem agradeço pela cessão da trilha sonora)

_._._._
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Estou só contentamento.
Mais uma vez fui telescopiada por Nel Meirelles.
Nel, agradeço muito.
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terça-feira, novembro 01, 2005

DOIS PERDIDOS

Nem sei se ele se lembra. Estávamos os dois a rodar pela cidade quando me perguntou:
- Para você o que sou?
Sem saber qual caminho tomar parei e o olhei de forma interrogativa.
- Para a esquerda ou direita?
- Por ali, não vê que estamos na contra-mão?
De repente um enorme caminhão... e eu... sanduíche de gente... apertei-me contra a guia enquanto ele me lançava um olhar divertido. Rezava para que não aparecesse um guarda. Seria obrigada a confessar que minha habilitação vencera há tempos. O celular disparado e eu enganchada entre uma moto e latas de lixo, sem poder atender.
Engatei a primeira e ele a me alertar:
- Está vermelho!
O celular parou. Aproveitei para acender um cigarro e esperei... ai que coisa boa, à meia luz, a sós, à toa...
No verde, segui.
- O que foi que você perguntou mesmo?
- Preste atenção. Deve entrar à direita na próxima esquina. Logo depois da curva, fique à esquerda.
No rádio, Rita Lee ainda fazia o fundo e eu cantarolando junto... você e eu somos um caso sério... antes de retomar a conversa.
- Fala, o que foi...
- Cuidado, está na faixa do ônibus... cada um na sua... uma quadra e... perdidos na cidade nua... passou, você passou!
Mais outra volta no quarteirão, naquele trânsito...
- Pode parar ali, perto da árvore. Chegamos.
Destravou o cinto de segurança e antes que eu puxasse o freio de mão já abria a porta
- Espera. O que me perguntou quando ainda estávamos na São João?
- Para você o que sou?
Tinha tanta ternura nos olhos que me perdi neles, não sabendo o que responder. Fechou a porta sem deixar de me olhar pela janela... empapuçados de amor... lançando um sorriso, endireitou o corpo e se apressou... ao som de um bolero... estava atrasado, claro.
Recuperando o fôlego gritei.
- Você é meu GPS!
Tarde demais. Buzinas encobriram a resposta. Estava parada na entrada de um prédio interrompendo a passagem. Ele, depois de contornar um buraco da calçada, olhou para trás, ainda sorrindo e acenou. Estava longe do alcance de minha voz. Não mais escutaria. Repeti, agora apenas sussurrando:
- Você é meu GPS, minha bússola.
Engatei a primeira. O pé escapou fazendo o motor engasgar. Na segunda tentativa consegui. Fui... mesmo não sabendo muito bem para que lado... você e eu somos uuuum caso sério... dose dupla...
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Inspirado em uma conversa com minha amiga Ádina, a quem dedico o post.
Os itálicos foram emprestados por Rita Lee e Roberto de Carvalho em Caso Sério.
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