segunda-feira, maio 30, 2005

ACHADO NO BAÚ

SERPENTEIA SERPENTINA
ATINA COM QUE EU QUERO CONTAR
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SOLTO O PASSO
VIRA A GINGA
VEM NO EMBALO DO BLOCO A DANÇAR
NÃO SE ABALE
SÓ SE EMBOLE
FINCA O CORPO
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TEM O CORSO
TEM CORDÃO
TEM O ENTRUDO
ENTRA EM TEMPO NO BLOCO A CANTAR
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E DESSE CANTO
EXPIA O ENCONTRO
QUE FAZ O ENCANTO
DE SE TROMBAR
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(De 1981 - dedicado a Caetano Veloso)

sexta-feira, maio 27, 2005

EM PACTO COM A SOMBRA

sei que aí estás
sinto em mim o teu perfume
se és tu a me emprestar as asas
sou eu a te fazer volátil
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somos vadias miragens
em vôos de figura e fundo
apenas suave aroma
incenso do que resta em nós
contínuo mote de agonia e gozo

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(Inspirado por um verso da Loba: “Não consigo entender como posso gostar tanto de mim até mesmo quando sou volátil como perfume de sombra” e dedicado a C.G. Jung)
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quarta-feira, maio 25, 2005

"DESÍGNIO"

Tudo era só contentamento, cuidado e espera
A alma brilhando tal alumínio depois de areado
Já não pregava os olhos há várias luas e sóis

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Ora no degelo se espraiando
Água viva escaldante beijo
Ora em fogueira se alastrando
Fogo vivo refrescante abraço
Crescente luz a pratear anseios
Tempo a pino sombreando dor
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Já não pregava os olhos...
“E eram os sonhos a mantê-la acordada”.

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(Dedicado a Darcy Ribeiro)

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segunda-feira, maio 23, 2005

ELOS PERDIDOS

Uma conversa pelo telefone aparentemente sem rumo, ingênua, daquelas que só acontecem entre amigos que se admiram e se respeitam. Partilha de contentamentos e sonhos, parecendo coisa de adolescentes não fôssemos as duas, Loba e eu, mulheres maduras. Uma idéia, a de sair pela vida procurando elos perdidos. Para a concretização dela, um passo. O evento, como qualquer evento, precisaria de tema, lema, logotipo, folder, panfletagem. Uma verdadeira campanha de marketing. E lá fomos nós.
No início lembrava-me alegremente das pessoas queridas, afastadas por contingências da própria vida e de como seria bom reencontrá-las. Porém, enquanto me envolvia com as providências para o evento, meu coração começou a pregar-me uma peça, assoprando-me um nome ao ouvido. Fingi-me surda por um tempo, mas vocês sabem o quanto o coração é persistente e o quanto é impossível o controle sobre ele. Rendi-me a pensar sobre uma relação rompida no desentendimento. Afundei-me na auto-análise. Imagens doridas, razões, motivos, desmotivos. Meus próprios erros, as expectativas que joguei sobre ela, as inevitáveis decepções, as ofensas mútuas e chorei. Surpreendentemente, pela primeira vez em muitos anos, vieram também lembranças tão boas. Nossos passeios pelos shoppings, nossas trocas de segredos, projetos que realizamos juntas e das leituras que ela fazia de minhas poesias. Suas interpretações dotavam meus escritos de uma beleza que eles não têm. Estava nela a poesia. E quem tem poesia no olhar tem o amor nos poros e na alma. Sabe amar e nos ensina a conjugar este verbo. Sei que neste momento uma reaproximação é impossível. Mesmo assim sinto-me aliviada. Algo se reconciliou dentro de mim. Recuperei um elo perdido em meio ao sofrimento e à dor. Hoje posso tranqüilamente responder ao meu coração. Sim, eu a amo e volto a chamá-la de irmã. Querida irmã. De quem só quero guardar, daqui para frente, os ensinamentos, o carinho, os momentos de partilha e completude.
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O tema ELOS PERDIDOS está rendendo. Catarse, polêmica, reflexão.

Acredito que em cada elo deixado pelo caminho está um pedaço de mim. Um tantinho de meu afeto. E que só sou inteira... se está inteiro o meu afeto.
Então vamos em busca de elos, elas, eles... nós.

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As instruções para o fazer coletivo estão no lobabh.zip.net e as participações podem ser enviadas também para:
adeliatheresacampos@hotmail.com
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sexta-feira, maio 20, 2005

A MAIS PURA VERDADE

Eram duas sementes. Com uma engasgou-se o menino. Outra na terra se quedou. Pisada, enquanto chegava a água e os inevitáveis tapas nas costas que faziam arder o menino. Quando o sufoco passou cada um voltou a seus afazeres e todos na cidade se esqueceram do fato. Até que o menino começou a mudar. Crescia a olhos vistos. Sua pele, antes puro veludo, foi se tornando rugosa e esbranquiçada. Entremeadas aos cachos de seus cabelos brotavam aqui e ali folhas imparipenadas. O povo daquela cidade, mesmo acostumado a tantos assombros, olhava de esguelha o menino. E ele crescendo. Em casa já não cabia. O coreto da praça o recebeu e sua mãe toda manhã deixava ali água fresca, o pão de cada dia e voltava a tratar do roçado. E ele crescendo. Assim já era demais. Os cachos todos sumiram. Sua cabeça era só folhas. E eis que, na primavera, surgem flores. Alaranjadas. Já não mais cabendo no coreto, plantou-se na praça o menino. O perfume que se esparramava para além dos limites do povoado atraía curiosos. Chegavam em caravanas, montados no lombo de jegues ou mesmo a pé. Na hora do ângelus mulheres rezavam o terço enquanto os homens faziam apostas no balcão do boteco. A quantas chegaria o menino se já media 15m. Tanto alarido chamou a atenção das autoridades. Montou-se uma comissão com os mais ilustres sábios do país. Chegaram em carros vistosos, trazendo aparelhos estranhos e passaram a estudar o fenômeno. Interrogaram os pais, vizinhos, retiraram lascas do menino-árvore. Examinaram, discutiram e foram embora. Sumiram sem dar explicação. Soube-se depois, que entrevistados por jornais e TV foram lacônicos ao responder. Nada a declarar. O menino-árvore é uma fraude para atrair incautos. Aos poucos o povoado foi voltando à normalidade. Acostumava-se. O menino, a essas alturas da história, com 25m oferecia uma fresca sombra para a hora em que o sol se estatela. Num dia, destes em que até o mormaço é silêncio e amolece, algumas crianças, aproveitando-se da sonolenta desatenção dos adultos, faziam arte com as flores caídas no chão. Bem picadinhas, misturadas à água, tinham ali um suquinho, um pouco ácido, embora gostoso, brincadeira comum entre crianças. E lá mandam o tal suco para dentro. E assim foi descoberta a propriedade emética do menino-árvore. Mas efeito oculto estranho. Primeiro as crianças se queixavam de dor de barriga e nó no estômago. Choravam. As mães acudiam aflitas, apoiando-lhes os espasmos. Pois não é que nada de nojento acontecia? O que punham para fora eram palavras transformadas em poesia. A surpresa logo se transformou em alegria. As crianças, agora livres de maiores indisposições, saíram a poetar pela vila e pelos campos. Eram só versos de amor sendo despejados por todos os cantos. O agreste agradecido de tanta belezura foi se transformando em verde. As colheitas se multiplicando. Até as brigas em ponta de faca, comuns depois das bebedeiras, cessaram. Tudo era só contentamento, cuidados com o menino-árvore e espera. A cada ano, uma nova primavera.
Da outra semente, nada se sabe. Alguns rumores davam conta de que ela, atravessando a Terra, tivesse saído por um furinho do outro lado e se perdido na estratosfera.
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Tenho aqui mais uma história. Mas essa nem vou me dar ao trabalho de contar, pois é pura balela. É sobre um astronauta excêntrico que afirma ter identificado um buraco branco muito luminoso, durante sua última viagem interplanetária. Grande descoberta científica, pois se sabe da existência de buracos negros. De brancos nunca se ouviu falar. Ele chegou até a escrever um artigo relatando como verdade que durante a primavera, do buraco branco, saíam revoadas de anjos carregados de sementes, em direção à Terra. Ainda bem que a NASA, depois de alguns testes psicológicos, internou o astronauta num hospício. De onde nunca mais saiu.
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(Inspirado pelo Zumbi e dedicado ao Linaldo)
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Aviso Importante
Na vida vamos permitindo que afetos nos escapem. Não importam os motivos do afastamento. Importa a falta que tais elos nos fazem. Se você quer se reaproximar de um amigo ou amiga, não perca a oportunidade. O blog da Loba está promovendo a semana do ELO PERDIDO. Vá até lá e participe.
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quarta-feira, maio 18, 2005

FEBRICITANTE

Se sou só ou se só sou, não importa.
Se é cara a cara nova de plástico em substituição ao rústico, nem sei.
Se o cara arranca da gente a grana depois de encostar o berro, quem liga?
Se o jornal mostra em letras garrafais o tanto que a garrafa mata, fazer o quê?
Se o mal vence o bem em quase todas as batalhas, continuo rezando.
Se a carne é fraca, o coração pedinte, o telefone toca...
Ai! Quando é que vão inventar a cura pra gripe?
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(Dedicado ao Dr. Marcos, para ver se ele me tira de estado tão lastimável)

sexta-feira, maio 13, 2005

COM LOUVOR

Volto aos bancos escolares
Em busca do conhecimento.
De mestra a aprendiz
Ponho à prova meus leitores.
Vago em ciência com eles
E juntos em folguedos vamos
Para o mundo do afeto.
Lugar em que nada se julga,
Em que todos são aprovados.
Bastam os ouvidos sensíveis,
A poesia no olhar,
A voz valente a empurrar,
Um coração feito sonho,
Sonho realizado abraço,
Abraço, resultado:
Vida.

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(Dedicado à Maria, ventre do Amor)
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terça-feira, maio 10, 2005

HOJE É DIA DE PROVA

questão de geometria
sendo longos os teus braços
tais linhas retas sem rumo
traça-me nas tuas paralelas
cruza-me entre as tuas diagonais
encontra a intersecção
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a figura resultante
dará ao espaço vazio
nova configuração?
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questão de acústica
estando inquieto o coração
deve-se procurar por sinais
na propagação do toque
de um telefone antes mudo?
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se a resposta for sim
demonstra como reverberar
o alô em tom maior
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questão de astronomia
considerando a órbita dos planetas
seus satélites, luas vagantes
pelo espaço sideral
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serão os corpos celestes
formas perdidas do amor?
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questão interdisciplinar
assinala a alternativa correta:
se eu
de outono me fizer primavera
serás para mim tradução
de um sol, sinfonia, um degas
em amor mais que perfeito?
......................................( ) sim
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Recomendações:
Lê com muito carinho, responde a tudo com capricho, não ultrapasse o tempo, nem abandone questão em branco.
Deixa embaixo da carteira o desespero desligado. Lembra-te que em caso de nota baixa, resta ainda uma chance. Construiremos a ocasião para recuperação.
Boa sorte!
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(Dedicado a um professor querido)
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sábado, maio 07, 2005

ENTRE ASPAS

Neste domingo das mães, deixo um poema de Leonardo Boff, extraído de seu livro:
O Senhor é meu Pastor.
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Deus, eu te encontrei novamente!
Até as lágrimas, em puro estremecimento!
Tu és o fascinante presente
Embora sempre tremendo.
Sim, Tu és meu nesse momento.
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Viver só para Ti, de Ti e Contigo!
Como antigamente, dia a dia.
Contigo sonhava e me perdia.
Saía de mim para ser um Contigo!
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Enfim cheguei ao lar materno,
Repleto de toda sorte!
O que der e vier é eterno
É amor de Mãe, na vida e na morte.
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Dedicado a você, mãe... beijos, carinho.
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segunda-feira, maio 02, 2005

RECORRENTE

de nada conheço tudo
de quase tudo, um pouco

sei da história do mundo,
da vida dos povos,
da sociologia,
psicologia,
e da ecologia,

sei de tanta coisa distante
sem significado imediato pra mim.

mas...
não sei de você
o que quer, o que pensa
se pensa que quer
o que quero em pensar.

Dedico aos sábios pensadores citados no post anterior, pedindo a eles que me respondam...

e agora?
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